quinta-feira, 20 de julho de 2017

NARCISO - NARCISO DAS AREIAS


                                 Fig. 1 - Gén. Narcissus                                                   Fig.2 - Pancratium maritimum 


O narciso das areias, Pancratium maritimum (Amaryllidaceae), ocorre no litoral do mar Mediterrâneo, crescendo fixo às areias através dos seus bolbos profundos. 


                                                                            Pancratium maritimum                                         Narcissus

                                                                                             
Está intimamente relacionado com as plantas do gén. Narcissus (fig.1) que aparecem em todo o hemisfério norte, compartilhando com estas a corola típica das flores. Uma diferença ocorre no Pancratium, cujos filamentos anexados à corola sobressaem da sua borda permitindo que as anteras se mantenham de pé (fig.2). Esta característica particular permite a identificação da planta em frescos antigos, apesar da estilização representada.

                                                            
SIMBOLISMO


Em fevereiro na Europa, Norte de África e Ásia, as flores do gén. Narcissus são um sinal da chegada da primavera. Através da antiguidade, o Narciso tem sido usado para simbolizar o caráter ambíguo do mês de fevereiro, contendo significados, dentro da mitologia grega, associados à vaidade e à morte.

O narciso das areias, Pancratium maritimum, é um género relacionado, embora a sua época de floração seja mais tardia decorrendo de junho até ao final do verão.
Vários poetas celebraram, nos seus versos, o narciso (de forma notável William Wordsworth), tendo o espírito de elevação dos seus versos refletido, mesmo nas sociedades de hoje, muitos dos sentimentos associados a essa flor.



Nas civilizações do mar Egeu as representações do narciso marítimo foram usadas em decorações dos edifícios. Em Akrotiri (Thera, Ilha vulcânica no mar Egeu) em vestígios arqueológicos conhecidos por “Casa das Mulheres” (Women’s House), encontram-se grandes plantas estilizadas pintadas nas paredes (séc. 17aC) que foram interpretadas como sendo narcisos das areias. As plantas pintadas nos frescos aparecem abrindo a corola em forma de sino, embora tenham sido removidas as partes externas do perianto. As plantas representadas apresentam uma altura impressionante de 140 cm de altura, embora o Pancratium selvagem tenha em média 30-40 cm (máximo 60 cm).

No contexto cerimonial da sala, os narcisos marinhos nos frescos de Akrotiri foram aparentemente destinados a dominar o espaço, preparando uma cena de veneração. Nos frescos observa-se uma mulher dobrada, segurando um avental ritual, numa cena que foi interpretada como sendo a investidura de uma sacerdotisa ou a veneração de uma deusa.

Em Creta, pelos vestígios encontrados, há a certeza de as sacerdotisas participarem, com os seus aventais de pele, nas cerimónias sagradas. Por esse facto, é apoiada a ideia de que as sacerdotisas de Thera estavam, da mesma forma, associadas aos rituais de morte ou ligação ao outro mundo.

No museu de Heraklion existe um sarcófago minoico de argila, onde se observam pintados narcisos das areias, assim como numa lâmina de bronze micénica, com a mesma planta, mas sem perianto, ao lado de um leopardo caçando patos selvagens. Em ambos os casos, a planta está conectada com a morte, particularmente com a morte violenta, daí a ideia dos mesmos crescerem no submundo, ao longo do rio Styx e serem frequentemente colocados em sepulturas.

                                                                                   Echo and Narcissus - John William Waterhouse (1903)

A mitologia grega atribuí, também, um valor simbólico à flor do narciso (gén. Narcissus) através da conhecida história de Narciso. Segundo este mito o jovem e bonito Narcissus apaixonou-se, fervorosamente, pela sua própria imagem refletida na água, rejeitando o amor de todas as ninfas em especial de Eco, uma ninfa que muito o amava. Como castigo pela sua vaidade e egocentrismo, Némesis transformou-o na flor que dele recebeu o nome.

Outra lenda conta que por ordem de Zeus, Gaia provocou a ocorrência de um perfume intenso através de flores de narciso que cresceram do solo, atraindo Perséfone, filha de Zeus e Deméter, para longe das suas companheiras e, assim, facilitar o seu rapto para o submundo.

Todas os narcisos encerram uma mensagem simbólica que aponta para a incapacidade de fugir à morte e para a transformação da própria vida. As flores do género Narcissus, desabrochando antes da primavera, lembram a morte prematura e, o Pancratium maritimum, florindo até ao final do verão, anuncia a chegada do Outono, quando a flora desaparece. O narciso das areias foi uma planta consagrada à deusa da vegetação (Perséfone ou Ariadne) que, em cada ano, tem de atravessar todas as fases da vida e da morte, na qual se inclui o submundo.

                                           Grandes Heures d'Anne de Bretagne




Na idade média a flor do narciso, com idêntica simbologia a ela associada, continua a aparecer em iluminuras e retábulos em contextos variados.  A sua representação não está, porém, restrita apenas às culturas cristãs ou europeias. Na China, por exemplo, é dada como presente, no Ano Novo Chinês, como um sinal de vigor renovado.



FONTE

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